Pinga Fogo com Adeildo Nascimento, da Dheo Consultoria

Em muitas empresas, a cultura vira uma armadilha. Os colaboradores mais antigos permanecem presos a uma espécie de Síndrome de Estocolmo corporativa, enquanto os novos não resistem e saem rápido. Nesse ciclo vicioso, a inovação não acontece. O negócio até cresce, mas sempre de lado — e acaba se parecendo mais com uma seita do que com uma organização saudável.

A fadiga moral já deixou de ser exceção e hoje é uma realidade dentro das empresas. Mas existe solução. É o que defendem Adeildo Nascimento, da Dheo Consultoria, o Professor José Nascimento, e José Manuel em uma conversa franca e sem rodeios.

No J17 Talks, eles conduzem um verdadeiro “pinga-fogo” sobre os dilemas da gestão de pessoas: cultura, clima, comportamento, liderança e estratégia. A discussão não fica na teoria — traz provocações práticas para gestores que lidam com ambientes fragmentados, equipes multifacetadas e um cenário em que a maior ameaça não é a concorrência, mas a própria cultura interna.

Abertura do Pinga Fogo com os participantes no estúdio

Sumário

Resumo executivo: os pontos centrais

  • Ludismo e consciência dos colaboradores: há uma mudança no perfil de quem trabalha nas empresas; colaboradores não aceitam mais liderança autoritária sem sentido.
  • Stakeholders e ecossistema: a organização não é mais um universo fechado; diversos atores influenciam e são influenciados pela empresa.
  • Decisão em tempos de conhecimento descentralizado: a tomada de decisão precisa ser mais colaborativa — isoladamente o gestor não chega tão longe.
  • Pessoas como fonte de inovação: com acesso a dados e debate, equipes podem apontar caminhos e oportunidades não percebidos pela diretoria.
  • Motivação é contagiosa — para o bem e para o mal: profissionais desmotivados tendem a contaminarem o clima; o inverso também é verdade.
  • Cultura versus planejamento: o planejamento estratégico orienta ações, mas é a cultura que suporta sua implementação; cultura nasce da liderança e pode ser transformada com contratações estratégicas.

1. Ludismo e a nova consciência do trabalhador

O termo “ludismo” aparece na conversa para ilustrar um fenômeno atual: colaboradores com mais consciência sobre seus direitos, propósito e expectativas profissionais. Segundo os especialistas, “não é mais quem manda que tem razão e os demais devem obedecer” — esta mudança exige das lideranças um comportamento distinto.

Na prática, isso significa que líderes tradicionais, baseados apenas na autoridade formal, encontrarão resistência. A recomendação implícita é migrar para modelos de liderança que valorizem diálogo, transparência e participação. Empresas que insistem em estruturas hierárquicas rígidas correm o risco de perder talentos e ver a produtividade ser afetada por um clima interno deteriorado.

2. Stakeholders: entender o ecossistema além das paredes da empresa

Os especialistas destacam que hoje as empresas funcionam como ecossistemas complexos formados por múltiplos stakeholders: instituições, órgãos reguladores, clientes, fornecedores, comunidades e colaboradores. Reconhecer essa rede é essencial para construir estratégias que sejam relevantes e sustentáveis.

Quando se considera o negócio como parte de um sistema maior, decisões deixam de ser tomadas com foco exclusivo em curto prazo ou apenas no retorno financeiro; passam a incluir repercussões sociais, reputacionais e ambientais. Esse olhar amplia o campo de atuação da liderança e exige habilidades de gestão de relacionamentos e negociação.

3. Liderança em tempos de conhecimento descentralizado

Uma pergunta capciosa é levantada no diálogo: “Em tempos de conhecimento descentralizado, como posso tomar decisões sozinho?” A resposta é direta: não é possível. A lógica é simples — o conhecimento não está concentrado em um único ponto da organização. Portanto, a liderança precisa articular processos colaborativos de tomada de decisão.

Modelos recomendados incluem: governança participativa, comitês multidisciplinares, sessões de co-criação e uso de dados para subsidiar decisões. O Professor José sintetiza bem: “Eu preciso das pessoas muito mais do que elas precisam de mim”. Esse reconhecimento transforma a função do gestor: de decisor único para facilitador de decisões coletivas.

4. Pessoas como fonte de inovação

Quando preparados com dados, informações e um ambiente favorável ao debate, as pessoas tornam-se geradoras de inovação. Os especialistas afirmam que o processo de troca de conhecimento produz o “óleo” da inovação — um fluido que lubrifica novos caminhos e soluções.

Por outro lado, sem acesso a dados e direção clara, equipes podem até contribuir para o crescimento, mas não têm ferramentas para evitar rumos equivocados. Existe uma fronteira entre empoderar e largar à deriva: o empoderamento eficaz exige informação, alinhamento de objetivos e canais de comunicação bem estruturados.

5. Motivação: a contaminação do clima organizacional

A questão da motivação é tratada de forma prática: colaboradores desmotivados contaminam o ambiente; colaboradores motivados podem, por sua vez, revitalizar colegas. A estratégia sugerida pelo diálogo é sequencial e pragmática:

  1. Tentar integrar e motivar: buscar envolvimento, treinamento e qualificação;
  2. Se falhar, tomar decisões firmes: não hesitar em desligar quem, mesmo com recursos oferecidos, persiste contaminando a equipe;
  3. Investir em agentes multiplicadores: profissionais motivados servem como vetores de energia positiva e podem reverter quadros isolados de desmotivação.

Essa postura combina empatia e assertividade. Primeiro tenta-se recuperar; depois estabelece-se limite para proteger o time. A analogia “uma maçã podre apodrece as outras” é usada para enfatizar que tolerância excessiva a comportamentos tóxicos pode ter custo alto para a organização.

6. Cultura versus planejamento estratégico: qual vem primeiro?

Uma pergunta clássica fecha o debate: “Primeiro organograma ou planejamento estratégico?” A resposta dos especialistas privilegia o planejamento estratégico, mas com uma precisão importante: o planejamento precisa ser sustentado por uma cultura organizacional consistente.

O ponto principal é que a cultura organiza como as pessoas agem no dia a dia. Um bom planejamento sem cultura alinhada vira papel sem execução. Da mesma forma, a cultura — embora enraizada nas pessoas — tem origem na liderança: “a cultura nasce no dono da empresa”.

Isso não significa que a cultura seja imutável. José e Adeildo falam sobre “adição cultural”: contratar pessoas estrategicamente para transformar a cultura ao longo do tempo. Em outras palavras, a mudança cultural é intencional e demandante de escolhas deliberadas, desde contratações até programas de desenvolvimento e incentivos.

7. Recomendações práticas para líderes

  • Adote um estilo de liderança colaborativa: promova espaços para participação e decisão compartilhada.
  • Invista em informação e dados: permita que as equipes tenham acesso ao que precisam para inovar com segurança.
  • Defina critérios claros para intervenção em casos de desmotivação: primeiro suporte, depois medidas firmes se necessário.
  • Use o planejamento estratégico como bússola, mas trabalhe a cultura como terreno fértil para que ele dê frutos.
  • Considere a contratação estratégica como ferramenta para evoluir a cultura organizacional (adição cultural).
  • Mapeie stakeholders e desenvolva ações que considerem impactos internos e externos.

8. Conclusão

O diálogo entre o Professor José Nascimento e Adeildo Nascimento sintetiza um desafio contemporâneo: gerir pessoas em um mundo de conhecimento distribuído e múltiplas demandas externas. A liderança exige menos imposição e mais capacidade de mobilização, motivação e construção de ambientes que transformem informação em inovação.

Empresas que entendem essa nova lógica — valorizando stakeholders, fortalecendo cultura alinhada ao planejamento e sendo firmes na gestão do clima — tendem a navegar melhor pelos desafios da atualidade. A mensagem final é clara: juntos se vai mais longe, mas é preciso escolher quem fica no barco e como navegar.

Perguntas frequentes (FAQ)

O que é “ludismo” no contexto organizacional?

No contexto apresentado, “ludismo” refere-se à maior consciência e assertividade dos colaboradores, que não aceitam mais uma liderança autoritária sem propósito. É um sinal de maturidade do mercado de trabalho.

Como a descentralização do conhecimento impacta a tomada de decisão?

Descentralização exige processos participativos: decisões isoladas perdem qualidade. Para aproveitar o conhecimento disperso, a liderança deve facilitar a colaboração, garantir acesso à informação e criar mecanismos de validação coletiva.

Colaboradores desmotivados sempre precisam ser demitidos?

Não. A recomendação é tentar envolver, treinar e qualificar antes de tomar medidas radicais. Contudo, se após intervenções a pessoa continuar a contaminar o clima, a organização deve priorizar o bem-estar coletivo e agir de forma firme.

O que é adição cultural?

Adição cultural é a estratégia de contratar pessoas com perfil desejado para, ao longo do tempo, transformar a cultura organizacional. É uma forma prática de induzir mudanças culturais sem depender apenas de iniciativas top-down.

Planejamento estratégico ou cultura: qual deve ser foco primeiro?

O planejamento estratégico deve orientar as ações, mas só terá eficácia se apoiado por uma cultura compatível. Portanto, ambos são essenciais e precisam estar alinhados — o planejamento define o “onde” e a cultura sustenta o “como”.

Como líderes podem fomentar inovação a partir das equipes?

Prover dados, espaço para debate, mecanismos de reconhecimento e tolerância calculada ao erro são formas de liberar o potencial inovador das equipes. A liderança precisará atuar como facilitadora desse processo.

Para aprofundar nas ideias e buscar consultoria, os especialistas mencionados estão disponíveis para contato: o Professor José Nascimento atua em gestão e Adeildo Nascimento na Dheo Consultoria, oferecendo caminhos práticos para implementar as recomendações discutidas.